Clima como variável independente das culturas
No registro das tradições arquitetônicas ao longo do tempo, a geologia e o clima nas diferentes partes do mundo determinam a maior parte dos materiais de construção que podem ser usados num certo lugar. Já numa perspectiva contemporânea, onde as cadeias produtivas podem ser globais, temos que levar em conta duas categorias de impactos que essas cadeias têm sobre a arquitetura:

- Primeiro, o impacto ambiental que decorre do transporte de longa distância (fig. 1);
- Segundo, o impacto socioeconômico de abrir mão do domínio local sobre as tecnologias da construção em favor de uma cadeia produtiva dependente de flutuações financeiras (fig. 2).
No cenário econômico e ecológico da atualidade, escolher os processos produtivos da arquitetura tradicional acaba sendo um ato de responsabilidade ambiental e social.

Redes comerciais de longa distância existem desde a idade da pedra, sobretudo para obter matérias-primas de importância estratégica como metais ou ainda para trocar produtos manufaturados de luxo, como diz o próprio nome da famosa Rota da Seda (fig. 3). Ainda assim, no que diz respeito aos insumos da vida cotiana, o abastecimento das sociedades tradicionais é predominantemente local.
O acesso a recursos naturais disponíveis na região é o ponto de partida da cadeia produtiva tradicional, mas a gestão e o processamento desses recursos é que definem a forma que esses recursos assumem enquanto componentes construtivos nas diferentes tradições. O modo de talhar pedras, o uso da argila em taipas ou em blocos, os encaixes entre peças de madeira são todas particularidades culturais que influenciam o processo construtivo e resultam naquilo que chamamos mais superficialmente de o estilo característico de cada tradição.
Nos aspectos estruturais da arquitetura tradicional, são observadas várias particularidades em relação à arquitetura contemporânea, na qual predominam lajes, vigas, etc. Já quanto às questões bioclimáticas, existem mais semelhanças, sobretudo, na postura passiva frente ao clima, de modo a agir com ele, e não contra ele.
O bioclimatismo ainda é uma ciência inexata, sendo que apenas recentemente tem-se aprimorado mecanismos de verificação de desempenho ambiental em edificações.
Para além de se servir dos materiais extraídos da natureza, uma tradição arquitetônica sustentável precisa garantir o manejo desses recursos no longo prazo. Na Mesopotâmia antiga, algumas mudanças importantes não só nos sistemas construtivos mas também na agricultura e na pecuária talvez tenham a ver com o desmatamento das encostas montanhosas que formam o perímetro exterior do Crescente fértil. Reflorestar, mas também extrair e processar minérios com prudência, têm que ser preocupações centrais no processo produtivo (fig. 4).
Em quase todas as cadeias da construção, existe um certo distanciamento entre, de um lado, a extração e o processamento dos materiais e, do outro lado, a especificação e o uso desses materiais na obra. O que é importante é que essa distância não represente, para o construtor ou o arquiteto, falta de conhecimento ou de preocupação com as etapas anteriores.
Três idades
A casa como abrigo bem-temperado para pessoas de todas as idades.
Ásia oriental

O universo geográfico e cultural chinês fica no cruzamento entre dois reinos biogeográficos (fig. 5).
Essa mistura de condições resultou numa tradição que se adaptava com facilidade a diferentes condições climáticas, de vegetação e outros recursos naturais, e consequentemente a modos de vida muito variados. fig. 6

O mundo influenciado pela cultura chinesa se estendia, no seu auge
durante o século VII d.C. (fig. 7), do
Turquestão ao Japão e da Manchúria à Indochina.Liang, A Pictorial History of Chinese
Architecture, 21.


Figura 8: Salão comunal semienterrado em Banpö, oeste da China, c. 4500 a.C. Desenho: Francis D.K. Ching. a – vista isométrica seccionada, b – corte longitudinal
Índia: unidade na diversidade
A cultura tradicional da Índia é exótica aos olhos do Ocidente num nível que outras culturas da Ásia não atingem. A China é centralizada, burocrática e materialista — todos valores que os europeus conhecem bem. Mesmo com toda a controvérsia em torno do Orientalismo, a cultura árabe partilha das mesmas raízes mediterrâneas e, sobretudo, greco-romanas da civilização europeia.
Em contraste, a representação da cultura indiana no Ocidente costuma recair em lugares-comuns do exotismo: espiritualidade mística, arte exuberante e livre de regras acadêmicas, uma estratificação social e de gênero opressiva e, claro, uma história tão antiga que os historiadores europeus do século XIX não podiam admitir que ela fosse verdadeira.

Essa era a opinião do historiador da arte anglo-indiano Percy Brown (fig. 9), um dos pioneiros no estudo das origens da arquitetura monumental na Índia. Para Brown:
Em cada um dos principais processos históricos da arquitetura há um princípio básico fundamentando a sua concepção, e que lhe dá a sua distinção acima de tudo. Entre os gregos era a perfeição refinada; edifícios romanos são notáveis pela sua construção científica; o Gótico francês revela uma condição de energia ardente, enquanto o Renascimento italiano reflete a intelectualidade da sua época. Do mesmo modo, a qualidade preeminente da arquitetura da Índia é o seu teor espiritual. … Ela é a mente materializada em termos de rocha, tijolo ou pedra.Brown, Islamic Period, 1.

Os pesquisadores indianos tratam do tema da espiritualidade na
arquitetura de modos variados, mas sempre diferentes do exotismo
ocidental. O historiador da arte cingalês Ananda
Coomaraswamy (fig. 10) foi um dos pioneiros da revisão da
arquitetura indiana segundo um viés que não se fazia subserviente aos
esquemas interpretativos europeus. Na verdade, Coomaraswamy defendia que
os conceitos tradicionais de arte na Índia e na Europa se aproximavam
numa transcendência universal;Coomaraswamy, Christian and Oriental Philosophy of
Art.
a história da arte moderna, segundo ele muito
materialista, não era capaz de explicar adequadamente essa unidade
conceitual.
Apesar disso, o sistema teórico de Coomaraswamy era uma faca de dois gumes. Por um lado, ele afirmava uma autonomia metodológica para a história da arquitetura indiana com respeito ao paradigma colonialista britânico. Por outro lado, esse sistema promovia uma espécie de colonialismo cultural interno. Coomaraswamy propunha uma unidade continental que tinha o hinduísmo como base e, mais ainda, afirmava a primazia da cultura ariana na história da Índia como um todo (atenção: nada a ver com o conceito nazista de “ariano”: os arianos de verdade foram um povo pré-histórico que viveu logo depois da separação do tronco linguístico indo-europeu; eles deram origem às sociedades e aos dialetos do norte da Índia e da Pérsia antiga).
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A interpretação da arquitetura na Índia antiga segundo Coomaraswamy postula a continuidade entre a civilização urbana do vale do rio Indo (fig. 11), na Idade do Bronze, e a cultura védica de tradição oral que introduziu a Idade do Ferro no subcontinente (figs. 12, 13). Essa pretensa continuidade tem sido um ponto de discórdia na historiografia da Índia: por um lado, os críticos dessa teoria argumentam que ela é um pretexto pseudo-científico para o supremacismo hindu; por outro, a evidência arqueológica cada vez mais tende a corroborar uma transição contínua entre as culturas das Idades do Bronze e do Ferro no subcontinente Indiano.

Uma das evidências mais antigas nesse sentido é um carimbo para
objetos em argila representando uma personagem com três rostos em
posição de iogue. Coomaraswamy chegou a identificar essa figura com o
deus hinduísta Shiva, mas essa identidade não é amplamente reconhecida.
Um argumento mais convincente é a continuidade da cultura urbana no
norte da Índia entre o declínio das cidades do vale do rio Indo, por
volta de 1300 a.C (fig. 11)., e a ascensão das cidades na planície
ocidental dos rios Ganges e Yamuna (fig. 15), que correspondem ao
período e à região das sociedades védicas antigas.Kenoyer, “Tems, Specialised Crafts and Culture
Change”.
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Duas estátuas muito pequenas, escavadas em Mohenjo-Dāro, acabaram se tornando o fulcro do debate sobre a unidade da cultura indiana. Uma delas (fig. 16) é em bronze não polido, portanto negra, e representa uma mulher com lábios grossos, cabelo encaracolado e nariz achatado — traços físicos dominantes hoje em dia entre os povos do sul da Índia. Por causa disso, ela foi apelidada de “dançarina dravídica”. A outra (fig. 17) é em pedra-sabão branca e representa um homem bom barba lisa e nariz aquilino — feições mais características do noroeste do subcontinente Indiano. Esta recebeu a alcunha de “sacerdote ariano”.
Essas e outras evidências descobertas desde a primeira metade do
século XX apontam para uma miscigenação
étnica e continuidade cultural entre a cultura da Idade do Bronze no
vale do rio Indo A população pré-histórica do vale do rio Indo
provavelmente não era dravídica e sim austro-asiática, parte de um
substrato que se estende até o sudeste Asiático.
e a cultura da Idade do Ferro na planície do rio Ganges,
dominada pelos indo-arianos. Essa miscigenação é muito mais antiga do
que se acreditava antigamente, e pode ter começado com as primeiras
migrações indo-arianas por volta de 1800 a.C. (fig. 18).

Nāgara vs Drāviḍa
Prevenções ocidentais: ênfase no templo como monumento vs diversidade das formas de devoção



Estratégias de ventilação
Ventilação por extração
No Japão, as casas semienterradas aparecem desde o final do
Paleolítico,Kawashima, “Burial Practices and Social
Complexity”.
e são cobertas com uma estrutura em madeira
revestida com casca de árvore (figs. 22, 23). Esse tipo continua
dominante na habitação rural japonesa, com alguns aprimoramentos, até o
século XVI d.C.


China: casas-pátio polivalentes
O primeiro exemplo de uma visão integrada sobre o tema é a casa-pátio da arquitetura chinesa, modelo que se reproduziu ao longo do tempo. Aqui, a arquitetura das habitações interage com as condicionantes urbanísticas de ruas retas e a limitação dos lotes, em formato retangular e mais profundo. Esse tipo de parcelamento urbano resulta da busca por eficiência e um certo pacto social, que acaba se difundindo pelo mundo. Nota-se, ainda, uma boa diferenciação entre espaços públicos e privados, aliados às formas mais fechadas da casa (nos formatos de U ou C) e a corredores contínuos ao longo da rua. Essa configuração favorece bioclimaticamente por permitir uma boa canalização do ar e o bloqueio de ventos mais fortes. Os beirais também geram uma circulação de pessoas mais protegida nas vias. Os interiores das casas em “U” (com três lados e um muro) ou totalmente fechadas para fora são voltados para os pátios internos.
Configuração do modelo dominante da casa chinesa, cujo clima é temperado com monções, o que demanda do edifício diferentes padrões de ventilação (mais direta ou indireta). Essas duas formas diferentes de lidar com a ventilação está relacionada com a ocupação do tecido urbano.

Figura 25: Modelo paramétrico de casas-pátio em Pequim, China. Modelagem: Liu Ziye, 2013.
Casas-pátio no Mediterrâneo


O bioclimatismo é um conhecimento muito complexo e específico de certas regiões, em razão das condicionantes locais. No caso do Brasil, é importante estudar os tipos de telhados locais, especialmente, os indígenas.
- Mesopotâmia
-
usam o pátio para coleta de água da chuva para as cisternas subterrâneas em seu centro, já que se trata de um bem precioso e de difícil acesso na região. Permite também acesso ao sol, que ajuda na ventilação por convecção (circulação do ar quente) de forma suave, indireta e com um ar com menos poeira.
Há um pátio totalmente recluso, comum nas arquiteturas da Bacia do Mediterrâneo, mas que não se refletem tanto em Portugal e, portanto, no Brasil (onde os pátios tendem a ter vocações muito mais ritualísticas que bioclimáticas).



Figura 28: Estratégias bioclimáticas de uma casa em Ur, antiga Suméria, III–II milênios a.C.

- Casas gregas
-
apresentam pátios voltados para o sul, virando-se o corpo principal da edificação para norte, eliminando sombras desse espaço. Ele recebe os ambientes no inverno para insolar suas paredes e aquecer os interiores. Esse esquema não apresentava grandes varações, estando orientados para sul de forma bastante padronizada em razão do desempenho bioclimático.
A tipologia da casa grega urbana se dividia em dois tipos mais
difundidos: a casa com pastas ou salão em forma de pórtico e a
casa com prostas, ou pórtico na frente de uma sala
separada.Graham, “Origins and Interrelations of the Greek
House and the Roman House”.
No tipo de casa com pastas, a sala
principal no térreo abria diretamente para o pátio, e ela tinha uma ou
duas células laterais sem abertura direta para fora, além de uma série
de células funcionais atrás do pastas, incluindo a cozinha
(fig. 29). Em casas mais ricas, o pastas podia dar uma volta
inteira no pátio e formar um peristilo.
Perto da entrada da casa ficava uma sala de jantar social ou masculina, o andron, geralmente acessado por uma antessala.
Já o tipo com prostas tinha um pórtico entre o pátio e a sala principal, chamada de oikos. Nesse caso também, o pórtico se abria sempre que possível para o sul. Essa composição se aproxima do tipo da régia, com um mégarōn atrás de um pátio. Ela se encontra nas casas na cidade de Priene (figs. 30, 31) e de outras cidades gregas.



A regularidade das construções escavadas em Olinto e em outras cidades planejadas indica que se valorizavam a equidade na distribuição da propriedade e uma relativa homogeneidade, ou isonomia em grego, no modo de vida dos cidadãos. Além disso, as casas seguiam, sempre que possível, a mesma orientação solar: a ala principal da casa se abria para o sul, sobre o pátio (fig. 32). A galeria coberta no primeiro andar (fig. 33) protegia os ambientes do sol a pino no verão, mas deixava entrar o sol de inverno, mais baixo.


Por outro lado, a orientação solar idêntica obrigava a mudar o posicionamento da entrada das casas segundo a posição da rua com respeito ao lote (fig. 34).


A importância dessa axialidade fica mais evidente em casas da elite, implantadas em lotes maiores, como a casa de Salústio (fig. 36). A composição principal dessa casa ignora as divisas do lote e forma um conjunto quase perfeitamente simétrico tanto na fachada quanto na planta. Em contraste, os anexos, como as lojas (fig. 36, n.º 4–9), e os espaços privativos da família, como os jardins com peristilo e o átrio secundário (fig. 36, n.º 31–35), se acomodam no espaço residual entre a composição axial e as divisas irregulares do lote. A vista é desimpedida desde a entrada principal da casa até o tablinum, a sala onde o chefe da família recebia os seus clientes (fig. 37).

O átrio da casa romana é sempre cercado por beirais amplos, geralmente sustentados por duas vigas principais que vencem o vão estrutural mais curto e sustentam outras duas vigas secundárias (fig. 38). Esse sistema deixa o pátio totalmente livre de colunas (fig. 39).
Com um clima mais estável e menos seco que na Grécia, não há tanta preocupação com a orientação do edifício, que, quase sempre, tem um pátio ou átrio central e apresenta o acesso axial direto para a rua. Nas versões mais ricas e luxuosas, pois os romanos são mais tolerantes com disparidades sociais, existem jardins com colunatas (chamados de peristilos). Suas ampliações ocorrem por meio da duplicação dos elementos padrão de um mesmo esquema de forma muito pragmática e diferente das construções monumentais e dos tipos edilícios de base, contando apenas com mais ambientes que não são necessariamente maiores. Com isso, nota-se a segregação social e relações com fortes hierarquias sociais, por exemplo, no caso das salas de jantar separadas para os visitantes mais ricos e próximos. Apresentam vãos livres entre 5 e 10 m, que variam conforme poderio aquisitivo das famílias. Já o paisagismo romano é funcional e ornamental simultaneamente.

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Os beirais do átrio oferecem uma circulação ao abrigo do sol e da chuva. Eles também canalizam a água para uma cisterna central, debaixo do piso (fig. 40). Deixar a água parada na cisterna ajudava a decantar as impurezas, mesmo quando o abastecimento vinha de um aqueduto e não da coleta da água de chuva. Outra canalização desaguava o excesso da cisterna sobre a rua (fig. 41).
Cisterna romana: a água é recolhida em um espelho d’água, que a refresca no verão, decantando as impurezas e caindo em um poço na qual é armazenada, sendo recolhida para uso posterior por baldes de forma manual.

A casa árabe urbana na bacia do Mediterrâneo combina características dos tipos grego e romano com adaptações bioclimáticas e construtivas originárias da Mesopotâmia. O tipo originário da casa árabe é, na verdade, uma morada rual. Ela parte de um terreiro cercado amplo, onde se podiam arrebanhar os animais da família durante a noite. Um dos lados desse cercado tinha um pórtico aberto para o terreiro, sem divisórias internas. O modelo paradigmático desse tipo é a descrição que foi transmitida através das gerações da casa do profeta Maomé em Medina, no início do século VII d.C. (fig. 42).
Não apresenta um tipo único de casa-pátio, mas variações conforme as diversas zonas climáticas abrangidas.
Na Península Arábica, há uma ocupação de baixa densidade com espaços reclusos e muito amplos, por se tratar de uma sociedade de pastores com rebanhos a serem abrigados nas moradias ou de comerciantes que demandam área para estoque de mercadorias). Assim, são verificados grandes muros e complexos familiares fechados, com ambientes internos divididos por tecidos, geralmente, e voltados para o pátio.
Fora da Arábia, são observados outros tipos de pátios, mais próximos aos gregos e romanos. Exemplo: Alhambra, em Granada na Espanha, com seus pátios destacados por espelhos d’água.
Leste (na região da antiga Pérsia): destacam-se as torres de ventilação, indicando a preocupação com o resfriamento dos ambientes, em razão do clima marcado pelos extremos de temperatura. Esses dispositivos forçam uma circulação mais intensa do ar, que se torna mais fresco, canalizando-o e atenuando sua velocidade (circula pelo ambiente e sai com rapidez), tornando-o também mais limpo.
- Hassan Fathy
-
foi um arquiteto egípcio que usa estratégias bioclimáticas tradicionais em edifícios modernos (décadas de 1920 a 1940) de forma bastante sustentável, tornando-se conhecido por isso.

Ventilação indireta




O uso das torres de ventilação associadas aos Qanat, que são aquedutos que partem do lençol freático e que levam água para outros pontos do território circundante e/ou incorporam características ornamentais com foco na irrigação de culturas. O ar entra através dos poços de visita em seus canais e passa por uma câmara que suga esse ar resfriado pela água, o qual segue pela torre de ventilação e chega até o ambiente externo, formando uma espécie de geladeira natural.
Figura 48: Qanat - Madarkoshi. Produção: Nikahang, 2018.


Ventilação cruzada





Civilizações hidráulicas
O Sudeste Asiático (fig. 56) é um caso específico de adequação da produção do ambiente construído humano a condições climáticas relativamente extremas, como verificado na arquitetura do Sudeste Asiático. Serão vistas questões sobre moradias e construções tomadas individualmente, mas, sobretudo, sobre um modo de gestão do ambiente em um sentido mais amplo, adaptado aos ciclos climáticos da região do oceano Índico. Entretanto, essas temáticas dizem respeito a aspectos gerais de todas as regiões tropicais do mundo, tornando-se exemplos interessantes para entender estratégias possíveis de adequação a essas situações.

Monções


Figura 57: Diagrama dos ventos de monções no oceano Índico e sul da Ásia. a – verão, b – inverno
A particularidade das zonas tropicais no Sudeste Asiático e na Índia é o regime de chuvas, que varia em sua quantidade sazonalmente entre escassez (fim do ano) e grandes volumes de chuvas (meio do ano). Ela é comum em todas as regiões tropicais do mundo (como em Brasília, com a ressalva da inversão das estações pela diferença de hemisférios), sendo marcada por uma maior intensidade pluvial no caso estudado. Essa condição influencia bastante o modo de vida das populações locais, muito dependentes da produção agrícola (a ser maximizada no período mais favorável do ano, permitindo a geração de estoque alimentar nas demais estações). Elas modificam seu modo de viver e adaptam suas formas de construir a essas variações, aproveitando ao máximo as chuvas e minimizando seus eventuais danos (como os furacões e as tempestades intensas na área do Golfo de Bengala (entre a Índia e o Sudeste Asiático), por exemplo, que resultam em calamidades gerais com enchentes, inundações, mortes, etc.).
Índia e Sudeste Asiático apresentam um clima sazonal comum com monções e estações relativamente secas (de baixa produtividade agrícola), resultando em trocas sociais, políticas e culturais, mesmo considerando a grande diversidade geográfica local. Nota-se uma influência quase imperial dos indianos para com as demais regiões vizinhas, quanto à organização política, material, cultural etc. Há também trocas de produtos, principalmente, frutas, plantas etc. Observa-se também importantes relações do Sudeste Asiático continental com o litoral e com o sul da China.

Figura 59: Ciclo das monções em Panorama point, Monte Methera, Ghats ocidentais. Fotos: Arne Hückelheim, 2010
Atualmente, a população local faz uma gestão ambiental muito marcada pelo período colonial (pelos ingleses e franceses sobretudo), principalmente, nas formas de produção agrícola, artesanal e habitacional. Trata-se de uma influência muito negativa, pautada nos climas europeus mais amenos e regulares ao longo do ano, sem extremos de chuva ou seca. Isso resultou no desmantelamento dos modos de vida e construção tradicionais do local, que eram mais adaptados ao ambiente. Adotaram cidades muito adensadas e formas de produção agrícola bastante inadequados ao local, voltadas para maximizar a produtividade com mecanismos artificiais (químicos), mas do que trabalhando com o próprio ciclo das estações. Todos esses aspectos deixam de responder às variáveis do clima nessas regiões.
Observa-se que, no Brasil, também há esse problema, devido ao controle artificial do solo e sua baixa sustentabilidade ao longo do tempo, sem respeitar o clima local. Nas últimas décadas, nota-se ainda mais essas inadequações com a destruição acelerada do cerrado e da Amazônia, revelando consequências climáticas e pluviais negativas muito mais amplas, que extrapolam o alcance regional e resultam nas crises hídricas e energéticas atuais, por exemplo.
Toda a intensificação de atividades econômicas e de adensamento urbano nessas regiões tropicais ao longo dos últimos 100 ou 200 anos, ocorreu em consequência dessas culturas colonizadores, regimes coloniais ou de sociedades pós-coloniais majoritariamente. Em contraste com isso, serão estudados sistemas sociais, políticos e econômicos que foram se adaptando às condições climáticas dessas regiões. Não por serem sociedades mais esclarecidas teórica ou ideologicamente, mas por se tratar de comunidades tradicionais sem mecanismos ou energia suficientes para contrariarem os regimes da natureza.
Na virada do século XIX para o XX, ocorre um aporte energético, com a utilização transformadora de maquinário agrícola, veículos para transporte da produção, capacidade de construção de edifícios e de adubar o solo, forçando a continuar alimentando as plantações mesmo quase sem nutrientes. Apenas mais recentemente, essas sociedades pós-coloniais estão tomando consciência das consequências negativas desse passado, com seus desiquilíbrios ecológicos e sociais. Ainda que esses recursos sejam uma possibilidade de tais comunidades prosperarem materialmente (em especial, para os mais pobres), resultam em um grande volume de produção e consumo não sustentável a longo prazo, sobretudo, do ponto de vista ambiental, social e alimentar.

Ceilão








Agricultura e comércio internacional
O desenvolvimento político e econômico do Sudeste asiático entre os séculos IX e XIV se deve em parte a um período de aquecimento global. Esse período de aquecimento deslocou as redes comerciais da Ásia da rota terrestre da Seda, que passava pelos desertos da Ásia central, para os percursos marítimos do oceano Índico (fig. 69). Além disso, esse período está associado à queda da dinastia Tang na China, que dependia do comércio na rota da Seda e do abastecimento em matérias-primas da Ásia central.

Esse processo permitiu a ascensão da dinastia Chola no sul da Índia como a primeira potência marítima e mercante da região (fig. 56). Enquanto isso, na China, a dinastia Song se abria para o sul, para controlar o abastecimento em dois insumos que estavam se tornando essenciais para a subsistência e o modo de vida dos chineses: o chá e o arroz. A chamada “antiga rota do chá” ou “rota do chá e dos cavalos (fig. 70)” dava acesso às plantações do sudoeste da China e do reino de Dali.


A antiga rota do chá era um sistema de caminhos de montanha (fig. 71), praticáveis só para carregadores pedestres, cavalos e mulas (figs. 72, 73). Ela permitia o escambo de chá chinês por cavalos tibetanos e o comércio de tecidos de seda chinesa e algodão bengalês — dois produtos manufaturados que eram exportados para toda a Ásia, África e Europa.



Com o aumento do comércio, a partir do século IX, a população do sul da China foi se urbanizando. Isso gerava demanda por abastecimento em grande escala. As regiões de monções se especializaram então no plantio em arrozais irrigados, uma das técnicas agrícolas de maior produtividade em todo o mundo (fig. 74).
Os três fatores — deslocamento das rotas comerciais para o sul, demanda por redes de abastecimento para as cidades grandes e aquecimento global permitindo o aumento da produtividade agrícola — gera uma economia do excedente agrário no Sudeste asiático. O comércio de longa distância nesse sistema é predominantemente baseado no escambo. Na ausência de moeda, o arroz é trocado sobretudo por artigos de luxo.
Gestão da água
O bom manejo da água é um aspecto fundamental em todas essas sociedades: estocagem, gestão, aproveitamento e vazão de excedente. No Ceilão (atual Sri Lanka), encontra-se um conjunto de terraços sobre uma grande rocha com um espelho d’água no centro, que é gerenciado conforme as estações do ano. Esses terraços ajudam no escoamento lentos do excesso de água, que é desviado dos pontos de acesso ao topo, também evitando erosões. Na seca, realiza-se o acúmulo em cisternas subterrâneas, poços muito profundos e espelhos d’água, além da carga manual morro acima. Esse local deixa de ser utilizado devido às dificuldades gerais de abastecimento do “palácio” em seu topo. A estrutura administrativa da cidade capital ficava na parte inferior, que alimentava a região mais alta na montanha.
- Vāstu śāstra
-
apresenta um traçado regulador a partir da divisão em lotes, percursos e jardins, que vai além de aspectos espirituais relacionados ao Feng Shui. Há muitos espelhos d’água, canais, etc. para estocagem de água e garantia de sua vazão. Estes estão conectados entre si e descarregam em cursos d’água naturais. Estão articulados com jardins nos eixos principais, encontrando-se habitações, comércio e outras estruturas urbanas no restante do território. Torna-se um modelo de ocupação com o palácio como elemento regulador central e a água sendo tratada de forma multifuncional (drenagem, alimentação, paisagismo, etc.). Há articulação entre os espelhos d’água, os quais cercam os edifícios administrativos que controlam as comportas e os níveis de água de forma equilibrada.
- Rota da seda
-
apresenta uma rede comercial muito importante e desenvolvida bastante cedo, inclusive levando mercadorias da região para o Império Romano. Abriga uma série de estados que mudam frequentemente, realizando trocas econômicas (com importantes rotas comerciais) e registros materiais e arquitetônicos notáveis. Essas rotas desarticulam-se apenas no século XX, com o grande desenvolvimento do comércio global, destacando-se a “Rota do chá” como a mais durável. A revolução comunista na China também contribuiu para esse declínio, sendo verificada uma tentativa de recuperação na atualidade.
- Índia e China
-
são grandes impérios político-culturais muito dinâmicos no tempo (até o Renascimento europeu pelo menos), rivalizando inclusive com o Império Romano em trocas comerciais e densidade populacional.
- Estradas e redes de caminhos
-
trata-se das encruzilhadas comerciais mais importantes da Idade Média, oferecendo dois produtos principais: alimentos e produtos de luxo, como tecidos e objetos de metais preciosos.
- Índia
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apresenta um grande volume e produção de tecidos, pelo acesso a um algodão de melhor qualidade, em oposição ao linho e à lã europeus (mais trabalhosos para fiar e com produtividade menor, resultando em uma qualidade inferior).
- China
-
é marcada pelas luxuosas sedas, exportadas para a Europa através da Rota da Seda, que também incluía o transporte de outros insumos, como o chá e o arroz.
Assim, explica-se a demanda por uma maior adaptação ao clima, já que era necessária uma produção em maior escala para exportação. Esse transporte acontecia em um terreno muito difícil (montanhoso), com clima desfavorável (chuvas intensas) e carga sendo realizada a pé ou com auxílio de cavalos, mulas, etc., sendo muitos desses caminhos talhados na rocha. Destaca-se que toda essa sistemática é desarticulada pelos ingleses durante a colonização.
Império Khmer, um estado agroexportador clássico
Apesar das montanhas, há uma grande produção de arroz irrigado, resultante do notável desenvolvimento das cidades chinesas, que demandam a importação desse alimento dos estados vizinhos. Esse processo leva à centralização de alguns estados na forma de grandes impérios, como o caso do atual reino do Camboja (Império Khmer). Com o expressivo fluxo de recursos vindos da China, cria-se uma economia de luxo (uma espécie de poder simbólico) para a elite dominante, que ostenta joias, armas e uma arquitetura muito representativa dessa realidade.
O império Khmer é um estado que se estabeleceu e se expandiu na onda da economia agroexportadora (fig. 75). Ele foi um estado altamente especializado: os seus objetivos eram produzir arroz para o mercado externo e controlar os percursos de escoamento da produção ao longo do rio Mekong, sobretudo para o norte na rota do chá e para o sul no comércio marítimo. A capacidade de organizar e manter o sistema agroexportador vinha da centralização política; essa centralização, por sua vez, era mantida tanto pela capacidade de o sistema alimentar a própria população local, quanto pela afirmação simbólica da legitimidade dos reis khmeres.

A legitimidade simbólica da realeza khmer estava atrelada à expansão do hinduísmo no Sudeste asiático (fig. 60) e ao conceito de direito divino da monarquia que se articulava no diálogo entre essa religião “importada” e as formas de religiosidade locais. O status divino dos reis estava, portanto, vinculado, por um lado, à obtenção de artigos de luxo por meio do comércio — sobretudo seda, ouro e pedras preciosas (fig. 76) —, e por outro lado à construção e manutenção de complexos monumentais de templos associados a palácios (fig. 77).
Recebe influência do Hinduísmo, que se espalha por seu prestígio cultural e pela associação com estados fortes e poderosos (com líderes importantes e expressivos), e não através da violência ou imposição. Ele também legitima a realeza e seus luxos, mostrando-se mais aberto (sem apresentar um livro único, por exemplo) e acomodando-se bem às religiões já existentes na área, que passam a se tornar meio híbridas.

Angkor

A capital khmer em Angkor cumpria ao mesmo tempo todas as funções de legitimação e manutenção do poder político centralizado. Antes de mais nada, a cidade foi escolhida para ser o centro de uma área extensa de arrozais irrigados, aberta no meio da floresta (fig. 78). A implantação da cidade perto da margem do Grande Lago era estratégica: as chuvas de monção fazem o volume do rio Mekong aumentar tanto que o sentido do curso do próprio lago se inverte, alagando a planície em volta dele (fig. 79).


A razão de ser da cidade era capturar os benefícios desse alagamento. Ele permitia fazer três colheitas de arroz por ano: uma colheita do arroz que crescia na região alagada, outra colheita em campos que podiam ser alagados artificialmente por tanques (fig. 80), e uma terceira colheita de arroz cultivado em terreno seco. Os canais e reservatórios, chamados baray em khmer, eram minuciosamente dimensionados e tinham um sistema de comportas. Durante a estação das chuvas, a cheia do lago alimentava os tanques; na estação seca, as comportas eram abertas e a água armazenada nos reservatórios era usada para irrigar os campos.

A cidade de Vrah Vishnulok (fig. 81) ficava no centro desse sistema. O complexo palaciano, conhecido hoje como Angkor Thom, ficava diretamente entre os dois maiores baray. Ao sul está Angkor Wat, o templo mais importante do conjunto. Os fossos que circundam Angkor Wat e Angkor Thom não são só elementos ornamentais ou de proteção, mas também faziam parte do sistema de gestão da água. A inserção da cidade administrativa no seu conjunto só passou a ser melhor compreendida recentemente.
Angkor Wat é o elemento chave que unifica todos esses elementos é a arquitetura monumental, representativa do poder do Império Khmer. Nela, destaca-se os grandes volumes de terraplanagem, além do fato de que há muito mais trabalho em canalizar e controlar a água do que no dispensado na monumentalidade e na simbologia real incorporada em seus edifícios de pedra. Recebe influências da arquitetura indiana nos telhados curvos com abóbada ogival em pedra (não em madeira). Os templos e os templos palaciano, que servem para legitimar o poder central, são uma mistura de propósitos em meio a um grande programa de irrigação e controle de água. A abundância de mão-de-obra também é responsável por sua exuberância. Um grande sistema de produção em monocultura para exportação (arroz) e dependente das monções com seus alagamentos sazonais funciona de forma única em todo o mundo: a correnteza do rio é tão grande durante as monções, que empurra esse volume de água para os afluentes, alagando toda a várzea e movimentando os sedimentos que se depositam na área alagadiça, tornando-a fértil para o cultivo. Atualmente, as barragens chinesas comprometeram esse sistema.
Até o começo do século XX, os arqueólogos acreditavam que Vrah Vishnulok era um complexo religioso–administrativo isolado no meio de uma vasta zona totalmente rural, como mostra a reconstituição da fig. 81. Em 2015, arqueólogos realizaram um amplo mapeamento a laser da mancha urbana antiga, revelando expressivos dados sobre o local. Então, cruzando os levantamentos de radar com o relato de um diplomata chinês do século XIII, Zhou Daguan, foi possível reconstituir uma imagem de Angkor Wat e Angkor Thom muito mais condizente com a capital de um grande império.
Todo o espaço em volta desses conjuntos axiais e regulares (fig. 82)
era ocupado por uma malha deformada de canais e tanques
secundários.Evans e Fletcher, “The Landscape of Angkor Wat
Redefined”.
As casas das famílias se agrupavam em volta desses
reservatórios menores. O complexo de Angkor era todo ele uma imensa
urbanização de baixa densidade, uma espécie de cidade-jardim, onde as
atividades agrícolas, artesanais, comerciais, administrativas e
religiosas aconteciam de modo distribuído por todo o território
(fig. 83).


Esse modelo põe em xeque a noção europeia e centro-asiática de cidade, que não inclui a agricultura. Trata-se de um sistema “sui generes”, que apresenta uma grande densidade espalhada pelo território de forma mais espraiada, com um tecido que mistura atividades urbanas e agrárias de forma articulada. Mesmo contendo um centro mais denso, no qual se localiza o palácio, ele vai se rarefazendo, ainda que mantendo-se uma considerável ocupação. Enfim, é um padrão de cidade formatada em uma mancha agro-urbana muito sustentável econômica e ambientalmente, mesmo com um modo de vida muito sazonal e dependente do excedente de produção a exportar.
Ressalta-se que havia produção alimentar de apoio para a população e gestão de seu estoque. O cultivo de arroz é muito intensivo, a partir de uma série de pequenos produtores familiares e áreas alagadas gerenciadas coletivamente. Destaca-se uma certa capacidade de manobra e descentralização do governo que organiza a irrigação, resultando em um cultivo rotativo que vai além da produção familiar. Ele conta com três ciclos produtivos com a água oriunda dos alagamentos, do estoque nos tanques e o arroz de tempo seco próximo às colinas (dependente apenas das chuvas).
Sede do governo: o centro de controle das comportas fica no palácio central (“bayon”), que dispunha de torres para inspecionar a situação dos reservatórios. Apresentava uma densidade populacional mais alta do que se imaginava, com muitas edificações, templos, terraplenos (para delimitar os canais) e casas tradicionais sobre pilotis de madeira (relativamente próximas umas das outras).
Conclusão
Assim como o império Khmer ascendeu no século IX graças ao aquecimento global e à demanda crescente por arroz no sul da China, ele entrou em declínio no século XIV com o início de um período de resfriamento global conhecido como a “pequena Idade do Gelo”. As chuvas de monção diminuíram ao longo de algumas décadas e as cheias do lago se reduziram, o que assoreou os reservatórios e reduziu a capacidade produtiva do campo em volta de Angkor. Sem meios de subsistência, a população se dispersou e o poder econômico e militar dos reis decaiu. No século XV, o império Khmer foi conquistado pelo reino de Sião — a atual Tailândia —, uma sociedade guerreira que não dependia de grandes redes comerciais.
Assim, ocorreu um relativo abandono da região com o tempo, devido ao declínio do poder político dos gestores das exportações, que é derrubado e a população se dispersa no século XIV. As instabilidades são geradas pela dependência das condições climáticas, pela política regional em desagregação, por um novo império na China (que dificultava as exportações) e pelo início de período de resfriamento global (a chamada “pequena idade do gelo” nos primórdios do século XIV), que leva à redução da energia solar no solo. A redução das monções e a baixa produção agrícola geram uma crise econômica local, desarticulando a capacidade de manutenção desse grande império, que é tomado pelos tailandeses e por sua agricultura de subsistência (que dura até o início da colonização europeia).
Modelos de urbanização em climas semelhantes aos do Brasil, mas com diferentes perspectivas econômicas, culturais, etc.